segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Vagabundagem em Alta


A Vagabundagem em Alta
Márcio Barker



Passo do malandro - Lia Snaders


''Trabalho igual ao meu
todo mundo quer,
mas nem todos podem arranjar.
Pego as onze horas,
largo ao meio dia.
E tenho uma hora pra almoçar.
Não há coisa melhor,
do que não fazer nada,
e depois descansar.''

Ismael silva


Rio de Janeiro, primeira metade do século passado.
E, lá vai ele, caminhando por uma rua qualquer. Na cabeça, algumas perguntas: a sua próxima refeição, do que seria? Onde seria? E como consegui-la?
As respostas eram vagas. De concreto, apenas o apetite, com o melhor dos tempêros: a fome.
O terno branco de linho e o chapéu panamá, ou de palha, ajudavam a amenizar o calor carioca. Por de trás da elegância do terno, do sapato bicolor, da gravata, do cravo na lapela, lá vai indo mais um infeliz, marginalizado.
Quem sabe morador dos antigos cortiços do centro da cidade, que foram derrubados em nome do progresso, e depois morador num barraco, dependurado num morro.
Sem emprego fixo, sem moradia descente, vivendo de bicos, ou de pequenos e indolores golpes. Debaixo do braço o violão, companheiro do samba no boteco, seresta, ou na cela, na delegacia. Dono de extensa ficha na polícia, pelo crime de vadiagem.
Lá ia ele pensando na sua próxima refeição e, primordialmente, como consgui-la. Puxa!!! Não era fácil essa tarefa diária, de sucesso duvidoso, incerto... Algumas vezes uma carteira, num bolso distraído, num bonde. Ou aquele amigo, que por acaso encontra no sentido contrário, na mesma calçada, ou ainda, aquela amiga, que palavras doces, e mãos sedutoras, conseguem arrancar uma ''ajuda''.
Lá vai ele, o malandro, o anti-herói, que faz da vagabundagem a arte da sobrevivência.
Como arma, usa sua simpatia, voz macia, gestos elegantes. Inpossível resistir. Ou em casos extremos, um belo par de mãos invisíveis, leves, ágeis, capazes de operações inimagináveis, no aperto do bonde vespertino. Detalhe: sem causar maiores traumas ao incauto, o dono da carteira. Um verdadeiro mágico da mão leve, rápida, insensível. Que beleza! Mais um dia salvo, mais uma, ou duas, refeições ganhas. Mais algumas cervejas, para animar um bom papo, até o galo cantar, anunciando o amanhecer.
Bem, já é hora de deitar.
Viva o malandro!



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